"Perturbados e espantados pensaram estar vendo um espírito. Mas ele lhes disse: Por que estais perturbados, e por que essas dúvidas em vossos corações?" Lc. 24,37-38.
Caríssmos irmãos precisou de um tempo para os discípulos aterrissarem no solo de Jerusalém no que tangeu à compreenção acerca dos últimos acontecimentos da vida de Jesus.
Ao lermos sobre espanto e o medo vividos por eles, parece que o que está à sua frente é alguém estranho que eles nunca viram, nunca conheceram e nunca tiveram qualquer experiência. E não é verdade. É exatamente o contrário. Aquele que está à sua frente fez parte de suas vidas, de suas caminhadas, de suas dúvidas e de suas certezas, de suas alegrias e de suas tristezas, em Nazaré, em Cafarnaum, em Jerusalém. Enfim, em toda a região da Judéia.
E por que o espanto? E por que a admiração?
Quanto ao fato podemos recordar alguns casos semelhantes: Maria se espantou ao anúncio do Anjo. Zacarias também e tantos outros diante da experiência que tiveram com Deus.
Lembrem que eles estavam espantados, surpresos, mas alegres. Ou seja, o espanto aqui não é um "medo, como quando se está frente a um perigo", como alguém lembrava, mas um sentimento de admiração, de surpreza, de alegria, algo que você quer explicar, mas não consegue, pois é misterioso, é enigmático, lhe preenche, lhe emociona, lhe faz perder a voz, aí você só curte, só contempla, só guarda no coração.
"Vede minhas mãos e meus pés, sou eu mesmo; apalpai e vede: um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que tenho" Lc. 24,39.
"Os ressuscitados não retomam o corpo que têm neste mundo. Seria ridículo se o homem tivesse de morrer para voltar a esta mesma vida. Morre-se para entrar na vida de Deus". Fernando Armellini. Celebrando a Palavra.
Até porque esse corpo em pouco tempo está decomposto, destruído, devorado, comido pela terra, e, portanto, Deus não precisará dele mais para nada, porque se precisasse, não teria através de Jesus, varado as portas do cenáculo sem que fossem tocadas. Na verdade, Ele tem a nos oferecer um corpo glorioso, incorruptível, imutável, com o qual nós haveremos de nos apresentar diante Dele, como operários que chegaram ao fim do dia de seu trabalho e agora convictos do que tudo foi concluído, de que tudo foi consumado, prestam contas com o seu Patrão.
Quanto aos versículos do capítulo de hoje estão cheios de gêneros literários. Por isso não podem ser lidos ao pé da letra. Então, está mais do que claro que eles não apalparam, não sentiram, porque isto dispensaria a possibilidade da fé, e suas dúvidas tinham cessado ali mesmo. Mas o fato pelo qual Lucas assinalou assim, é para dizer que o Cristo Ressuscitado não deixou de participar da vida e da lida dos seus irmãos. Perceber isso, notar isso, crer nisto exige tempo, caminhada, entrega, oração e ESPANTO.
O perigo é a gente não se espantar mais, o perigo é a gente não se surpreender mais, o perigo é a gente não lutar mais, o perigo é a gente não denunciar, não anunciar, não se angustiar, fazendo com isso que as mazelas tanto espirituais, quanto materiais, sociais, culturais, se alastrem e o mundo e a socieade, permaneçam desreipeitando e matando, índios em Brasília, lavradores no interior do Maranhão, homossexuais nas grandes metrópoles; escravizando crianças em grandes fazendas pelo País a fora, jovens entregues às drogas, consequentes de um país que abandonou, abortou; aliás, antecipadamente matou, seus filhos, como acabamos de acompanhar na aprovação pelo Supremo da Lei que garante à mulher interromper a gravidez, caso o filho seja um anencéfalo.
O mesmo vale para o pedaço de peixe assado. Jesus não é um fantasma, nós o sabemos, mas também, não veste mais a roupagem corpórea, passageira e frágil, que nós nos vestimos, dependendo de tempo, espaço, comida e bebida, para sobreviver. Mas, o comer de Jesus, é um modo do Evangelista assinalar, que ele, mesmo não estando mais fisicamente junto aos seus discípulos, ele o está espiritualmente, participando, comungando e acompanhando os seus passos ao longo de suas vidas.
Abriu-lhes então o espírito, para que compreendessem as escrituras, dizendo: Lucas 24,45.
Talvez seja isto que ainda esteja faltando em muitos de nós. Um espírto aberto, um espírito desarmado, um espírito desprotegido das redomas das nossas verdades, interesses, paixões e vaidades.
Talvez seja isto, que ainda esteja faltando para que a nossa fé não vacile tanto, e nós que antes éramos tão animados, corajosos, entusiasmados, porque tudo corria a nosso favor, agora, ao primeiro vendaval, à primeira tempestasde, à primeira provação, nos desmanchamos em queixas, lamúrias e perguntas provocativas contra Deus.
É verdade que como os discípulos, nós precisaremos de um tempo para irmos perdendo o medo, a insegurança, especialmente o medo de amar e perdoar. E nos apropriarmos de uma fé mais profunda, uma fé que nos encha de entusiasmos nao só nos tempos de primavera, mas principalmente nos tempos de invernos e tempestades que por ventura venham passar nossas vidas.