segunda-feira, 28 de maio de 2012

29 DE JUNHO - SÃO PEDRO

"Vinde após mim e eu vos farei pescadores de homens". Mt. 4,19

Não dá pra falar de Pedro sem lembrar aquele dia em que Jesus o chamou juntamente com o seu irmão André à beira do lago de Genesaré.  Momento em que eles "abandonaram a barca e seu pai e o seguiram". Mt. 4,22.

 Os três anos de experiência com Jesus serviriam para revelar como Pedro precisaria sair das alturas em que se encontrava, para descer, para tocar os pés no chão da realidade, realidade esta, que serviria como prenúncio do que também haveria de lhe ocorrer tempos depois em Roma.

É mais ou menos assim que acontece com quase todo mundo. Ao ouvirmos o chamado, seguimos, só que muitas vezes, um seguimento alicerçado na emoção, na euforia. Mas, aí, é preciso dar passos mais profundos, deixar para trás vícios, melindres, fantasias, pensamentos, verdades, razões, projetos pessoais, porque estamos nos lançando num projeto que não é nosso, mas de Jesus Cristo. Neste caso, se o que nos sustenta for a euforia e a emoção, nosso seguimento está fadado a desmoronar e a ruir, porque euforia e emoção não servem como base nem alicerce para vocação.

Assim, os três anos foram marcados por sins e por nãos, por acertos e contradições, e entre erros e acertos, e entre elogios e decepções, chegou-se ao grande dia, ou à grande noite, a noite da condenação. E ali, bem ali, no pretório de Pilatos, quando três vezes interrogado se havia entre ele e Jesus qualquer relação, Pedro disse não. Eu nem conheço tal homem. Mt. 26,72b

"Depois disso, tornou Jesus manifestar-se aos seus discípulos junto ao lago de Tiberíades. Tendo eles comido, perguntou-lhe pela terceira vez: Simão filho de João, amas-me? Pedro entristeceu-se porque lhe perguntou pela terceira vez: Amas-me? Senhor, tu sabes tudo, tu sabes que te amo. Apascenta as minhas ovelhas" Jo. 21,1.15a.17

Já se foram três anos, viagens, pregações, ensinamentos, reuniões, confrontos, milagres, elogios, traições. Agora lá estão novamente, na mesma praia, no mesmo lago, no mesmo barco. E quando soa pela terceira vez a pergunta: Simão filho de João, amas-me? Pedro não resiste, entristece, mas mesmo triste, sua resposta é uma música que não muda a nota, muda o tom. Pois aquele Pedro eufórico e emotivo tinha ficado para trás. O som que agora sai de sua boca, é de alguém prudente, amadurecido, experiente  nas idas e vindas, no solo quente da Galileia.

Pedro precisou de três anos, precisou voltar ao começo, precisou voltar às águas azuis esverdeadas do Mar da Galileia, para renovar seu chamado e seu sim, que mediante dúvidas e incertezas, os havia abandonado e largado na noite mais ingrata de sua vida. E você, tem voltado ao mar? Tem voltado à praia? Quantos anos você precisa? 

Morto de cabeça para baixo em Roma, é um sinal de que nada disso mais importa. É que aquele Pedro imaturo e fraco da Galileia, agora é um homem maduro e forte, tão maduro e tão forte, que não hesita em entregar seu corpo à morte, como oferenda agradável a Deus.

Celebrado em 29 de junho, ele é o pescador e apóstolo da Galileia, que tornou-se pescador e apóstolo de Cristo, Que o fez pescador e apóstolo dos homens e do mundo.

Por Padre Isaque Marques













sábado, 26 de maio de 2012

HOMILIA DO DOMINGO DE PENTECOSTES

"Antes  de  ser  uma festa dos cristãos, Pentecostes foi festa dos judeus, e sua origem  se perde nas sombras do passado. Antes de se chamar assim, tinha  outros  nomes,  e era  uma festa agrícola. Em Êxodo 23,14-17   é  chamada de  Festa  da Colheita,  a  festa  dos primeiros feixes  de  trigo  colhidos. Em Êxodo 34,22 é chamada de Festa das Semanas. Por que  "festa das semanas"?  A  explicação  é dada pelo Levítico (23,15-21): calculavam-se 7 semanas a partir do inicio da colheita do trigo. 7 semanas = 49 dias. Com o tempo, ela perdeu sua ligação com a  vida  dos  agricultores,  recebeu o nome grego de Pentecostes e  se tormou  festa cívico-religiosa. No tempo de Jesus, celebrada  50 dias  apos a  Páscoa,  ela recordava o dia em que no Monte Sinai, Deus entregou as tábuas da Lei a Moisés. Os Atos dos Apóstolos fazem coincidir a vinda do Espírito Santo com a festa judaica de Pentecostes". Artigo Paróquia São Paulo apóstolo.

Caríssimos irmãos após esta pequena viagem histórica acerca da Festa de Pentecostes, cabe-nos agora refletir a implicância, a importância e o significado da mesma nas nossas vidas.

"De repente veio do céu um barulho como se fosse uma forte ventania. Então apareceram línguas, como de fogo  que se repartiram e pousaram sobre cada um deles".
Meus irmãos, não esqueçamos que na cena, primeiro veio um barulho de vento, depois apareceram línguas de fogo. O fogo lembra a sarça ardente no deserto quando Deus apareceu a Moisés, a sarça não se consumia, e a sarça ardia. A Sarça é Deus, o fogo é Deus ardendo de amor por nós, o fogo é Deus queimando-se de amor por nós. No deserto, durante a noite, Deus era uma coluna de fogo para clarear o caminho dos hebreus. E hoje ele continua sendo o mesmo fogo para clarear nossas noites, clarear nossas trevas, clarear nossas escuridões.

"Cheios de espanto e admiração diziam: Como é que nós os escutamos nossa própria língua? Nós que somos partos, medos, e elamitas, habitantes da Mesopotâmia, da Judéia, da Capadócia..."

Quantas e quantas vezes esses versículos se tornaram motivos de discussão, dentro da nossa Igreja, devido o fenômeno das línguas estranhas. Certamente a discussão se dá, porque ficamos presos ao fato da linguagem . Porém, não é uma questão de linguagem, é uma questão de propósito, de referencial e de valor, é uma questão de comunhão de alma e de amor. Quem não compreende isto?

O importante é saber que agora o Pentecostes não é mais uma festa apenas dos judeus, mas é de todos; de medos, elamitas, de católicos, protestantes, de santos e pecadores, de rico e de pobre; o Pentecostes é de todos aqueles que sabem que precisam clarear suas noites, que precisam aquecer suas friezas, que precisam romper suas trevas.

"E depois de ter dito isso, soprou sobre eles e disse: Recebei o Espírito Santo".
A cena nos faz voltar ao gêneses, ao princípio da criação, quando Deus sopra nas narinas do homem, até então, barro, para fazê-lo sua imagem e semelhança, para fazê-lo gente, para fazê-lo homem.

Se voltarmos no tempo, e se contarmos de uns 30 anos para cá podemos observar quantos grupos, quantas pastorais, quantos movimentos da Igreja, até então, tão fortes, tão vibrantes, tão entusiasmados, na caminhada foram esfriando, foram perdendo o brilho, foram se acabando. Também da mesma época, quantas famílias, quantos casais, quantos jovens, quantos irmãos nossos até então entusiasmados, foram desanimando, foram se separando, foram desistindo e muitos mesmos, até morrendo.

É preciso um novo Pentecostes, é preciso um novo fogo abrasador, é preciso um sopro quente, um ar quente que entre pelas nossas narinas, e que penetre todo o nosso ser, que toque e  que transforme este homem encurvado, angustiado, desanimado e o faça alegre, entusiasmado e vibrante de novo.

Depois de tudo o que falamos, cabe ainda perguntar: o que significa mesmo o Pentecostes para nós? O Pentecostes nosso se resume às nossas liturgias e às nossas Celebrações? E o que pensar dos desempregados, das crianças abandonadas; o que pensar dos sem terra, sem teto; o que pensar dos que são neste instante desrespeitados nos seus direitos e agredidos na sua dignidade?


O nosso Pentecostes ficará devendo ao mundo, ficará devendo à vida, se se contentar apenas com os cantos e as orações feitas entre as quatro paredes da Igreja. Mas é preciso que ele aconteça para aqueles que vivem à margem da sociedade, que vivem a margem do direito e da dignidade. E eu concluo com a mesma conclusão da homilia da Vigília de Pentecostes. 


Hoje, certamente todas as paróquias estão celebrando este dia. Oxalá! Junto a toda a sua programação, não esqueçam de lembrar dos milhões e milhões de pobres, de desempregados, de moradores de rua, de moradores de viadutos, de bancos de praças, favelas e calçadas, abandonados por esta sociedade. E assim, a nossa celebração, a nossa liturgia, mas que uma celebração e uma liturgia, seja também um grito, uma denúncia profética contra o sistema econômico, capitalista, que mergulhado no projeto de ter mais, exclui pequenos e pobres, índios e negros, homens e mulheres,  pelos quatro cantos deste país; até que um momento, o fogo que acendeu o Círio pascal a 50 dias e que hoje se encontra, se mistura e se confunde com o fogo deste dia, o fogo do Espírito Santo, possam aquecer, possam esquentar, possam aliviar o frio, a dor e a fome desses irmãos, e assim o Pentecostes deste dia, o Pentecostes Litúrgico, o Pentecostes Espiritual, se traduza e se converta nas suas vidas, na vida desses irmãos, em Pentecostes de pão, em Pentecoste de alimento, em Pentecostes de direito, em Pentecostes de justiça em Pentecostes de vida e dignidade. AMÉM









sexta-feira, 25 de maio de 2012

HOMILIA DA VIGÍLIA DE PENTECOSTES

"Se alguém tiver sede, venha a mim e beba". Jo 7,37b

Caríssimos irmãos há 50 dias atrás, mais ou menos por esta mesma hora, neste mesmo lugar nós, com pedaços de paus, gravetos e cavacos, acesos, acendíamos o Círio Pascal, dando assim início à celebração da  Mãe de todas as vigílias, a Vigília Pascal.

Apesar de não termos cessado de celebrar a Eucaristia ao longo dessas semanas, não sei se tivemos atentos, de que aquele fogo e aquelas chamas que acenderam o Círio Pascal, não ficaram na noite daquela festa e daquela celebração, mas se estenderam até hoje, e os raios daquele fogo, não dos gravetos e cavacos, mas do fogo do próprio Jesus, se encontram com os raios do fogo desta noite, que é o fogo do Espírito Santo, clareando, aquecendo e incendiando as noites das nossas trevas que ainda teimam em escurecer nossos corações.

Mas o convite de hoje, é: "se alguém tiver sede venha a mim e beba", convite este completado por um trecho do profeta Zacarias: "Quem crer em mim" como diz a escritura: "Do seu interior manarão rios de água viva" Zac 14,8.

Meus irmãos domingo passado iniciei minha homilia tratando exatamente do ato de crer, assinalando que crer significa ir ao encontro de Jesus como discípulo dele. Discípulo que escuta o ensinamento do Mestre e converte este ensinamento em gestos de fraternidade, justiça e solidariedade.

Quem tiver sede venha: falar da água, me faz recordar alguns momentos ao longo da história do povo de Deus. Primeiro, o dilúvio, onde o pecado da humanidade ali se afogava, ali se sucumbia, para emergir uma nova criatura, através da nova criação inaugurada por Cristo mediante sua Paixão e Morte Redentora.

Mais tarde no deserto, quando o povo sente sede, Moisés tomando de uma vara, fere a pedra e a água jorra, saciando a sede do povo.

Penso que esses dois registros são suficientes para num salto aos dias atuais, pensar na seca porque passa grande parte do povo nordestino, fenômeno, que uma vez assistido e ouvido pela televisão, nos choca, nos emociona, nos faz ter pena até, mas talvez esqueçamos de aferir, de verificar,  que tal situação não acontece unicamente como um ato natural, mas também, é fruto da ação desastrada do homem, que faz da terra um baú, onde ele só mete a mão, explora, violenta, agride, e o pior, violenta e agride porque o lucro e o capital são o que mais lhe interessam, em detrimento, de culturas, vidas e histórias construídas ao longo de anos e anos, mas ali em minutos, em segundos, violentadas, agredidas, desrespeitadas, destruídas.

Meus irmãos, vocês podem está se perguntando: o que isso tem a ver com a festa de hoje, o que isso tem a ver com a Vigília de Pentecostes?

Por que não estamos aqui apenas louvando, dando glórias, cantando? Podemos, podemos sim, cantar, louvar, dar glórias, mas tudo isso pode parecer um ato alienante, se a a gente não sentar os pés na realidade, não sentar os pés na situação, não sentar os pés no chão do problema. E a realidade, a situação e o problema são milhões de pessoas famintas, sem casa, sem terra, sem direito, sem saúde, sem educação e sem vida, espalhadas por este mundo todo, e as vezes, bem perto dos nossos olhos, o que falta-nos, é enxergar, ver, descer até elas.

Neste sentido celebrar a Vigília de Pentecostes sem tocar nessas questões é fechar os olhos para um problema que ceifa a vida de milhões de irmãos nossos. Irmãos que semelhantes ao povo do deserto estão igualmente com sede, sede de pão, sede direito e sede de justiça, sede de moradia, precisando neste instante de novos Moisés que não tenham medo de tomar da vara da palavra, da vara da eucaristia, da vara do Evangelho, e ferir, mas se ferir não resolver, quebrar as pedras, e as rochas de agora, que têm impedido, dificultado a vida de tanta gente.

E a propósito, da indicação do Profeta Zacarias: Do seu interior brotarão rios de água viva, perguntemo-nos: como vai nosso interior? Que fonte estamos buscando para saciar nossa sede? Qual é mesmo a nossa sede? O que é mesmo que nos inquieta neste momento de tanta aridez e de tanta rachadura no solo da nossa sociedade política, econômica, no solo da nossa sociedade religiosa brasileira?

Nós temos sido uma Igreja profética, libertadora, que se deixa usar pelos pequenos e pobres, pelos humildes e fracos,  para gritar ao mundo, para ser a sua voz no mundo, e para dizer ao mundo que a fome  e a sede que pesam sobre suas costas, não é um ato casual, muito menos vontade de Deus, mas um plano, uma elaboração do próprio homem na ganância de mais ter?

Nós, enquanto Igreja, temo-nos feitos a voz deste povo, como os profetas do passado, que se fizeram a voz de Deus, e gritaram, e denunciaram, e morreram, ou ao contrário, estamos acomodados, quietos, produzindo uma Igreja elitizada, aburguesada, morna, silenciosa, apática, amarelada, omissa, ou a Igreja dos grandes templos, das grandes e lindas vestes, das vestes dos reis e imperadores, que nos encantam, que encantam o nosso povo? Mas ninguém se pergunta o que os reis e os imperadores, os mesmos que usavam tais vestes, faziam com o povo?

Hoje, não são poucas as Paróquias, Igrejas e Capelas por todo canto realizando ato semelhante ao nosso, palestras, gincanas, shows, adorações e Eucaristias. Oxalá! Junto a toda a sua programação, não esqueçam de lembrar dos milhões e milhões de pobres, de desempregados, de moradores de rua, de moradores de viadutos, de bancos de praças, favelas e calçadas, abandonados por esta sociedade. E assim, a nossa celebração, a nossa liturgia, mas que uma celebração e uma liturgia, seja também um grito, uma denúncia profética contra o sistema econômico, capitalista, que mergulhado no projeto de ter mais, exclui pequenos e pobres, índios e negros, homens e mulheres,  pelos quatro cantos deste país; até que um momento, o fogo que acendeu o Círio pascal a 50 dias e que hoje se encontra, se mistura e se confunde com o fogo desta noite, o fogo do Espírito Santo, possam aquecer, possam esquentar, possam aliviar o frio, a dor e a fome desses irmãos, e assim o Pentecostes desta noite, o Pentecostes Litúrgico, o Pentecostes Espiritual, se traduza e se converta nas suas vidas, na vida desses irmãos, em Pentecostes de pão, em Pentecoste de alimento, em Pentecostes de direito, em Pentecostes de justiça em Pentecostes de vida e dignidade. AMÉM














terça-feira, 22 de maio de 2012

HOMILIA VII DOMINGO DA PÁSCOA

“Quem crer e for batizado será salvo quem não crer será condenado” Mc. 15,16.
Meus irmãos, partamos do prefixo deste versículo. Quem crer. Crer significa ir a Jesus. Mas ir como, em que condição? Com certeza, ir como discípulo, como discípula. Como discípulo e discípula que escutam que ouvem e que se deixam penetrar e envolver pelo que o mestre quer ensinar. 

Mas não é só ouvir, escutar, contemplar, mas, sobretudo e acima de tudo transformar o que ouviu o que escutou em gestos de fraternidade, justiça e solidariedade. 

Gesto de justiça e solidariedade principalmente ao irmão que não foi irmão, ao amigo que também não o foi, para traduzir o nosso alcance à estatura de Cristo, como bem lembrou São Paulo hoje, num claro sinal de que nossa maturidade espiritual também se elevou.

Ser batizado significa ser alcançado pelo Salvador. E uma vez alcançado, lavado, também transformado, curado, santificado. Não é para isso que estamos aqui? Estamos aqui para experimentar este batismo, estamos aqui para experimentar esta salvação.
Quem não crer será condenado. Meus irmãos Cristo não condena ninguém, Cristo não julga ninguém. Nós é que nos julgamos e nos condenamos a partir da posição e da decisão que tomamos diante Dele, contra Ele ou a favor de Dele.

"Pegarão em serpentes e se beberem algum veneno mortal, não lhes fará mal". Mc. 16,18.

Ninguém deve sair por aí pegando em serpentes ou escorpiões, só porque temos essa fala saída dos lábios de Jesus. É importante atentar para o instrumento simbólico do texto. Os animais nunca vão deixar de agir conforme a sua natureza, seus instintos e reações. Nós é que devemos agir diferente deles, ou seja, diante dos venenos dos nossos irmãos, sejam eles da nossa casa, do nosso trabalho, da nossa rua, do nosso grupo ou pastoral, não deixar que isso nos mate, nos humilhe, nos derrote. Para tanto, nos munirmos do antídoto. Mas o antidoto de um cristão ante a ofensa recebida, não é o ódio, vingança ou rancor, mas o AMOR proposto por Jesus na Cruz.

E é este mesmo antídoto, e é este mesmo amor que igualmente lhe ajudará a suportar os achaques, os venenos e as contrariedades que também lhes poderão atingir vindas do ponto de vista físico, psicológico, emocional e até mesmo espiritual.

sábado, 12 de maio de 2012

VI DOMINGO DA PÁSCOA

"Levanta-te. Eu também sou apenas um homem". Atos 10,26.

Estas foram as primeiras palavras de Pedro ao entrar na Casa de Cornélio, quando este num gesto de saudação caiu ao seus pés e se prostrou.

Embora sendo um gesto de saudação, e já muito praticado entre os judeus e os fariseus, Pedro renega o gesto, porque não quer que o mesmo se estenda para este momento, uma vez que o Mestre sempre pediu humildade, simplicidade e serviço a todos, ao invés de honrarias e privilégios.

Num ambiente religioso em que os pagãos eram vistos com olhos de preconceitos, pessoas de má vida, que não mereciam a salvação, Pedro de forma solene diz que "Deus não faz distinção de pessoas. Pelo contrário, ele aceita quem o teme e pratica a justiça, qualquer que seja a nação a que pertença". Atos 10,34-35.

Tem hora que cabe perguntar: Nós que estamos mais envolvidos com os trabalhos da instituição, entendemos assim? Nós que constituímos grupos, movimentos e pastorais da Igreja, acreditamos nisto? Acreditamos que o Espírito Santo, Jesus Cristo não são propriedades de uns poucos privilegiados , santos e escolhidos, mas ele desce sobre todos, ele fala a todos, ele se mistura com todos, negros, índios, mulheres, pretos, brancos, ricos pobres, sem terra, com terra, homo afetivos, sem se importar com o que a sociedade hipócrita e farisaica acha e julga?

Tem hora que cabe perguntar: A Igreja enquanto Instituição tem se sentido livre, para entender, ler, traduzir o seu papel e a sua posição, não como núcleo fechado, redomado, trancado a sete chaves, mas capaz de se permitir a uma abertura maior para os leigos, não unicamente nos serviços litúrgicos do altar, que ainda são mínimos , escaços e limitados, mas ouví-los, escutá-los, saber o que eles sentem, pensam e têm a nos ensinar?

Tem hora que cabe perguntar:  Como essa mãe, hoje é dia das mães, tem tratado aqueles filhos, que por algum pecado, falha, ou alguma posição diferente saíram dos seus quadros, das suas fileiras. E agora distantes sentem-se excluídos, marginalizados, quando na verdade precisam sentir-se não condenados, mas amados?

"De fato estou compreendendo que Deus não faz distinção de pessoas". Atos 34. Oxalá, cada dia a Igreja seja mais próxima, mais humana, e mais parecida com o seu Mestre, porque não temerá em ser mais próxima, mais humana e mais parecida com os seus filhos.

"Como o Pai me ama, assim também eu vos amo. Permanecei no meu amor". Jo 15,9.

Como é difícil falar de amor, como é difícil permanecer no amor, como é difícil amar como Jesus amou. O que significa amar como ele nos ama? No Antigo Testamento haviam 613 Mandamentos, mandamentos que muitas vezes se constituíram fardos pesados e difíceis de o povo carregar, assumir e vivenciar. Não foi à toa que Jesus foi resumindo, foi diminuindo, ficando só o amor, porque ele sabia que uma vez, este, sendo vivenciado e praticado, os demais estariam superados.

Ele nos amou com o amor que o Pai lhe amou. E foi este amor que o Pai lhe amou que ele entregou para nós. Aonde? Na Cruz. Eu falei na homilia passada que todo amor traz uma dor, uma morte, uma cruz. Ou seja, se quisermos aceitar a condição de amar, precisamos está preparados para não esperarmos recompensa, porque ela pode não vir. Ao contrário, esperemos dor, ingratidão, sofrimentos, e estes podem vir. 

Hoje experienciamos um conjunto de regras e normas da Igreja, que creio, ser no sentido de purificar o modo cristão de cada um. Porém, há momentos, em que a aplicação das mesmas parece um medo de se chocar com o diferente, com o novo e com o rápido, propostos, e muitas vezes impostos pelos ventos do mundo pós-moderno. Então, ficamos num arcadismo, num anacronismo litúrgico, às vezes pastoral, clerical, porque não sabemos responder as perguntas e questionamentos deste momento. Nos fechar, é um modo de fugir do incômodo que a atual realidade nos faz.

Amar com o amor de Jesus não pode ser um canto emotivo, ou uma teoria morta e sem sentido, mas a capacidade e a coragem de enfrentar o momento presente, entender os seus sinais e as suas exigências, sugerir coisas novas, tomar decisões, arriscar, ousar, mesmo correndo o risco de errar. Não dá é pra ficar ciscando em torno de si com faz a galinha figurada por Leonardo Boff no seu livro "A Águia e a Galinha". Mas é preciso, voar, arriscar, mesmo correndo riscos, como diz Padre Zezinho na sua canção.

Amar com o amor de Jesus significa olhar para o irmão, para a irmã, e dizer para ela que Cristo a ama assim como ele é, como ela é. Não importando o culto, a religião, a cor, o sexo e a classe social a que pertence. 

Porque ela, ele, estão acima de tudo isso, valem mais que tudo isso, valem mais que a religião, valem mais que a classe social, valem mais que a regra, valem mais que a lei. E toda vez em que a sociedade entendeu o contrário, toda vez que a sociedade leu diferente, toda vez que a própria religião entendeu diferente, certamente não estavam entendendo nem a lei e muito menos a pessoa. E quando elas entenderem, saberão que a pessoa vale mais do que a lei.




















sábado, 5 de maio de 2012

HOMILIA 5º DOMINGO DA PÁSCOA

"Naqueles dias Saulo chegou a Jerusalém e procurava juntar-se aos discípulos. Mas todos tinham medo dele, pois não acreditavam que ele fosse discípulo". Atos 9,26 
"Depois que Estêvão foi morto, e com a aprovação de Saulo, rompeu uma grande perseguição contra a comunidade de Jerusalém. Muita gente se dispersou pelas regiões da Judéia e Samaria. Saulo devastava a Igreja. Porém, no caminho de Damasco, quando o mesmo ainda seguia seu intuito perseguidor contra todos que seguissem a doutrina cristã, subitamente o cercou uma luz vinda do céu. E caindo por terra ouvia uma voz que lhe dizia: Saulo por que me persegues? ... Senhor que queres que eu faça? Levanta-te e entra na cidade". 

Caríssimos irmãos agora entendemos a reação dos discípulos, seus medos e suas desconfianças em relação à pessoa de Paulo neste instante em que ele busca se juntar a eles. Para eles Paulo ainda é Saulo, aquele que eles o viram perseguindo, odiando e matando. E não o que caiu do cavalo, o que tirou as escamas dos olhos, o que abandonou o ódio e se vestiu de amor.

E agora, voltando às velhas indagações: Por que você está aqui? Você está aqui para purificar o seu cristianismo, você está aqui para depurar, para refinar o seu ser cristão. E se você quer um modelo, um exemplo a ser seguido, contemple Paulo, vejo-o agora rejeitado, desprezado, tendo todos os olhares torcidos na sua direção. Paulo desanimou? Paulo desistiu? Paulo se queixou? Não. Ao contrário, buscou entrar em comunhão com aquela comunidade, entendia o seu sentimento, entendia as suas razões, mas as mesmas não foram motivos para sair pelos cantos se queixando, reclamando, desistindo, chorando.

Quando eu repito, e me torno talvez até cansativo, quanto às perguntas que faço, é no sentido de avisar, de alertar, que na comunidade, na Igreja, no grupo, existem incompreensões, existem traições, existem contrariedades. E nessas horas uma pessoa desavisada quanto a essa possível realidade, pode desanimar, desistir, abandonar, como tantas e tantas já fizeram, e fizeram se achando as pessoas mais injustiçadas do mundo.

E o amor onde é que fica? Você pensa que amar é fácil? Todo amor trás uma dor, um sofrimento e às vezes  a própria morte. Se você optou por amar, então só ame. Mas se ao amar, as respostas da outra parte foi só desgosto e decepção, então só ame. Mas se depois de todo serviço prestado, de toda doação, de toda entrega, só recebeu fel, amargor, então só ame.

"Naquele tempo, Jesus disse aos seus discípulos: Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o agricultor. Todo ramo que em mim não dá  fruto ele  o corta". Jo. 15,1.

Eu quero cantar para meu amigo seu canto de amor a respeito da vinha: Meu amigo possuía uma vinha num outeiro fértil. Ele cavou e tirou delas pedras; plantou-a de cepas escolhidas. Edificou-lhe uma torre no meio, e construiu aí um lagar. E contava com uma colheita de uvas, mas ela só produziu agraço. Is. 5,1-3.

Caríssimos irmãos agora sabemos porque Jesus se auto proclama a videira verdadeira. Ele o faz, exatamente, porque Israel se tornou uma videira falsa, azeda e amarga. 

Pois bem, deixando Israel e seu azedume de lado, pensemos agora que Jesus é o tronco da videira, nós os seus ramos, e os frutos nascem daí. Perguntemo-nos: Que tipo de fruto estamos produzindo neste momento? Um fruto agradável ao agricultor, ou um fruto amargo, azedo e ingrato?

Todo ramo separado do tronco seca, mucha e morre. Quantos irmãos generosos, serviçais, bondosos, um dia, decepcionados com as fragilidades de outros irmãos, com as fragilidades da própria Igreja se desligaram, se afastaram, do Cristo e da comunidade.

Talvez, pensaram que aqui era o céu, que aqui era santo, que aqui era luz. Aqui é céu sim, aqui é santidade sim, aqui é luz sim. Mas aqui também é trevas, aqui também é pecado, aqui também é imperfeição, aqui também é humanidade, aqui também é fragilidade. E tudo isso em algum momento se confunde, em algum momento se mistura, em algum momento se atropela. Não por acaso, mas no intuito de no fim, a luz vencer a treva, o céu vencer a terra, e a fragilidade ser superada pelo amor e pela santidade. Quem foge dessa luta, porque pensava que tudo já estava resolvido, perde a chance de se tornar santo e acaba secando, muchando  e morrendo.

Podar é cortar, podar é ferir, podar não é só tirar os galhos secos, mas também os galhos verdes, aqueles que são excessivos e não somam para a pureza e para a santidade. Cada um sabe os galhos que tem, cada um sabe os defeitos que tem, cada um sabe, que, se quiser alcançar a santidade precisa aceitar a poda, precisa aceitar o corte, precisa aceitar a dor, precisa deixar sangrar, para daí brotar  fraternidade, perdão, justiça e amor.